Os três conselheiros do TCE-MS (Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul), afastados em 8 de dezembro do ano passado, no âmbito da operação Terceirização de Ouro, por suspeitas de corrupção, correm o risco de atravessar o Natal e Ano Novo, pela segunda vez, grudados a incomodante tornozeleira eletrônica. 


Em decisão recente, semana passada, o ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça), Francisco Falcão, concordou com o recurso de Thais Xavier Ferreira da Costa, chefe de gabinete de um dos conselheiros afastados, Ronaldo Chadid, a se livrar da tornozeleira. 


A defesa dos três conselheiros, Waldir Neves, Iran Coelho das Neves e Chadid, também apelaram pela retirada do equipamento. 


Contudo, o ministro relator ainda não examinou o recurso. Pelo calendário do expediente do STJ, a corte funciona até terça-feira (19). E o recesso segue até fevereiro que vem, daí o risco de os envolvidos remunerados com salários que beiram à cifra dos R$ 50 mil mensais seguirem monitorados no período festivo que se aproxima. 

Além da tornozeleira, Chadid, Iran e Valdir, embora com o salário em dia, foram afastados dos cargos, proibidos de entrar no prédio do TCE e até de se comunicarem com colegas servidores também investigados por corrupção. 


RECURSO ACEITO 

Thais Xavier foi denunciada pelo MPF (Ministério Público Federal) por ter, supostamente, participado de um esquema de lavagem de dinheiro junto com o conselheiro Ronaldo Chadid. No negócio, os dois teriam captado recurso por meio de venda de sentença. 


Além da tornozeleira, Thais foi “afastada do exercício das funções públicas por prazo de 180 dias [em junho deste ano o prazo foi esticado para mais um ano]; proibida de acessar as dependências do TCE e de utilizar dos serviços da corte; vedação de comunicação com quaisquer das pessoas mencionadas na decisão, assim como outros conselheiros, servidores e funcionários da empresa Dataesy Consultoria e Informática Ltda [empresa também implicada na trama da corrupção]”. 


Na apelação de Thais é argumentado que “as medidas foram fixadas há quase um ano, sendo necessária à sua revisão, notadamente em razão do adiamento da apreciação do recebimento da denúncia oferecida, inicialmente previsto para a sessão de julgamento da Corte Especial no dia 6/12/2023 [sessão foi adiada e deve ser remarcada em fevereiro que vem]”. 


Defesa de Thais sustentou ainda que “é mera servidora do Tribunal de Contas, condição distinta dos conselheiros investigados, e que o afastamento do cargo público é medida desarrazoada e que causa prejuízo à própria administração pública”. Acrescentou, ainda, que o monitoramento eletrônico seria uma medida imposta “desproporcional”. 


Embora a queixa da chefe de gabinete afastada, o ministro Francisco Falcão disse em sua decisão: 


“Considerando as peculiaridades do caso concreto, entendo que seguem presentes os requisitos autorizadores da decretação das medidas cautelares impostas, notadamente ante a necessidade de resguardar a regular instrução das investigações ainda em curso e, para preservar a imagem da Corte de Contas e sua credibilidade perante a sociedade”. 


O ministro conclui a decisão dizendo que “... considerando a inexistência de incidentes relacionados ao cumprimento das medidas cautelares impostas, que vêm sendo integralmente cumpridas pela requerente, autorizo a remoção do dispositivo de monitoramento eletrônico, mantendo-se as demais cautelares impostas até a apreciação do recebimento da denúncia pela Corte Especial”. 

ESQUEMA 

Os inquéritos em andamento no STJ, mesmo com os conselheiros afastados, permitem o prosseguimento da investigação do esquema de desvio de dinheiro do TCE-MS.  


Conforme apurado pela PF na Operação Terceirização de Ouro, deflagrado ano passado, o esquema criminoso teria resultado em desvios dezenas de milhões de reais e agora o MPF quer que eles devolvam R$ 106 milhões.  


Para que os envolvidos se apropriassem dos recursos, a empresa Dataeasy, que tinha um grande contrato de prestação de serviços, e também muito genérico, comandava o esquema. Era ela, por exemplo, que terceirizava supostos funcionários fantasmas do TCE-MS e que contratava serviços suspeitos.  


Conforme apontou a investigação, a empresa servia de cabide de emprego (contratava com altos salários pessoas indicadas pelos conselheiros) e ainda era uma espécie de caixa paralelo dos envolvidos no esquema: foram descontados mais de R$ 9 milhões em cheques com destinação duvidosa e ainda declarados serviços comerciais prestados ao próprio Tribunal.  


Para aumentar os indícios, a Dataeasy recebia por tarefas executadas, e não por número de funcionários. As tarefas são exatamente as mesmas realizadas por servidores de carreira da corte. 


Contratada em certame licitatório que durou apenas 29 dias (período mais curto que qualquer outras licitações no TCE), quando Waldir Neves presidia a Corte, a Dataeasy permaneceu prestando serviços até o ano passado, quando a operação da PF foi desencadeada. Essa continuidade é um dos motivos de o presidente da Corte à época, Iran Coelho das Neves, também ter sido enquadrado. 


Um dos contratados pela Dataeasy, que na verdade nunca prestou serviço algum à empresa, é o primo de Waldir Neves, William das Neves Barbosa Yashimoto, considerado faz-tudo de Waldir. 


“Constatou-se efetiva manipulação e fraude nos registros do e-TCE a fim de gerar produtividade falsa”, indicou o inquérito.